A emergência das Infraestruturas Públicas Digitais (IPD) promete ser uma força transformadora no domínio da governação, susceptível de modernizar a gestão das finanças públicas (GFP), melhorar os serviços prestados e fomentar o crescimento inclusivo. Em toda a África, os governos reconhecem o potencial das IPD para fazer face aos desafios sistémicos, melhorar a transparência fiscal e autonomizar as populações vulneráveis e marginalizadas. Estes temas mereceram o foco das atenções na Conferência Internacional sobre as Finanças Públicas na Era Digital, promovida conjuntamente pela Iniciativa Colaborativa para a Reforma Orçamental em África e a ODI Global (ODI), em Novembro de 2024, na África do Sul.
A conferência reuniu profissionais das finanças públicas, decisores políticos e peritos de todo o continente e mais além, que partilharam ideias e estratégias para alavancar as IPD nas finanças públicas. Desde os sistemas inovadores de subsídios sociais da África do Sul até aos esforços de mobilização de receitas na Zâmbia, os debates destacaram a necessidade premente de impulsionar as soluções digitais mais susceptíveis de estimular o desenvolvimento sustentável no continente. As IPD não se limitam a tecnologias - representam uma nova forma de pensar sobre a governação que pauta pela eficiência, a equidade e a resiliência.
Este é o primeiro de uma série de blogs dedicados às principais conclusões da conferência.
Em que consistem as IPD?
O termo “IPD” é relativamente recente. Refere-se frequentemente a um conjunto de sistemas básicos - como identidades digitais, bases de dados interoperáveis, plataformas de pagamento ou quadros de partilha de dados - que permitem aos países oferecer oportunidades económicas e prestar serviços sociais de forma eficiente e eficaz. Ao contrário das ferramentas digitais isoladas, as IPD assentam em sistemas integrados e escaláveis que servem múltiplos objectivos em todos os sectores. Esta abordagem que começa pelas bases pode alterar significativamente a forma como os ministérios das finanças funcionam ao, por exemplo, assegurar uma melhor coordenação e eficiência dos investimentos digitais, conjugado com uma preponderância na prestação de serviços aos cidadãos.
Como contribuem as IPD para a forma em como gerimos os recursos públicos?
As IPD sustentam a tomada de decisões baseadas em provas factuais ao facultar informações sobre a despesa e as receitas públicas em tempo real. Por exemplo, o Sistema de Acompanhamento da Despesa do Ministério das Finanças (MOFET) do Gana permite o acompanhamento da despesa em tempo real, o que reduziu o tempo de recolha de dados em 50%. Esta capacidade permite aos ministérios das finanças acompanhar o desempenho fiscal com maior eficácia, afectar recursos de forma estratégica e resolver ineficiências. No entanto, os aspectos positivos das IPD ultrapassam a mera melhoria do funcionamento interno da administração pública. Durante a conferência, os oradores destacaram a forma como as IPD já começaram a remodelar os sistemas de finanças públicas em vários países africanos. Por exemplo, o Sistema Em Linha de Gestão e Transferência de Informação (OTIMS) do Uganda simplifica o acesso a informação sobre as transferências fiscais intergovernamentais, melhorando assim a exactidão e a distribuição equitativa dos recursos. O Sistema de Monitorização eMUNI do Tesouro Nacional da África do Sul aumenta a transparência das finanças municipais, e o seu Modelo de Maturidade das Capacidades de Gestão Financeira (FMCMM) reforça a gestão financeira em todas as entidades públicas.
Um novo papel para o Ministério das Finanças?
O papel do Ministério das Finanças na promoção das IPD foi explorado no decorrer de um dos principais debates da conferência.
É evidente que o ministério das finanças desempenha um papel fulcral na consecução das reformas digitais: ao questionar e supervisionar as dotações para iniciativas digitais e evitar a duplicação de despesas às quais os governos africanos simplesmente não podem fazer face. A par disto, os ministérios das finanças também têm tradicionalmente liderado a implementação de reformas digitais da GFP em todos os governos, bem como os Sistemas Integrados de Informação de Gestão Financeira (IFMIS), que provavelmente exigirão ajustes constantes para manterem a sua eficácia e relevância.
No entanto, uma abordagem centrada nas IPD – que reconhece o potencial para explorar a articulação com a economia em geral – pode exigir que os ministérios das finanças ultrapassem o seu papel tradicional.
Os ministérios das finanças devem fomentar a colaboração intersectorial para assegurar um investimento coeso em infraestruturas digitais. Na qualidade de administradores dos orçamentos nacionais, estão em posição única para definir a visão relativa à adopção das IPD e garantir que as iniciativas digitais estejam alinhadas com os objectivos fiscais e de desenvolvimento mais amplos.
De igual modo, uma abordagem de IPD requer uma liderança forte e uma cultura de inovação e adaptabilidade para enfrentar os desafios da transformação digital e projectar sistemas que, em última análise, contribuam para uma melhor governação e qualidade de vida para os cidadãos. E enquanto guardiões dos recursos públicos – que congregam um poder de persuasão importante – os ministérios das finanças podem influenciar significativamente a forma como as entidades públicas lidam com as reformas digitais.
Por último, os ministérios das finanças têm o poder de conduzir as conversas internacionais em torno das reformas digitais. Plataformas como a CABRI representam uma oportunidade significativa para os países de todo o continente se pronunciarem de uma só voz e fortalecerem a partilha de conhecimentos entre os ministérios das finanças. A Presidência do G20, que será assumida pela África do Sul em 2025, apresenta uma oportunidade estratégica. Com base nas agendas de IPD avançadas pela Índia e pelo Brasil, a África do Sul tem, efectivamente, a oportunidade de posicionar a África como líder na governação digital global. Ao defender investimentos em infra-estruturas digitais, o fortalecimento de capacidades e políticas inclusivas, a África do Sul pode amplificar a voz de África na cena internacional.
A Conferência Internacional sobre Finanças Públicas na Era Digital destacou o potencial transformador das IPD para modernizar os sistemas de finanças públicas, aumentar a transparência e impulsionar o crescimento inclusivo. Enquanto a África do Sul se prepara para modelar a agenda global no G20, o continente tem uma oportunidade sem precedentes de se posicionar como defensor da governação digital. Ao alavancar as IPD, os países africanos podem desenvolver sistemas financeiros não apenas modernos e eficientes, mas também inclusivos e resistentes.
O caminho para a transformação digital não está isento de desafios. Mas com uma liderança forte, a colaboração regional e um compromisso para com a inclusão, África pode aproveitar o poder das IPD no sentido de criar um futuro mais brilhante e mais equitativo para os seus cidadãos.